O ocaso dos blogs
Cora Ronai
"Sábado de madrugada, depois de dar comida pra Famiglia Gatto e checar minha mailbox, comecei a brincar com este blog. Deviam ser umas duas da manhã. Agora são quatro e tanto (vocês podem checar pela marca da hora, aí embaixo) e, finalmente, a coisa parece estar funcionando. Por que demorou tanto? Porque eu sou fresca e levei horas escolhendo um template legal e fazendo nele as modificações que me pareceram necessárias. Com o tempo, se eu tiver paciência — e talvez tenha — vou tentar incluir fotos e inventar outras gracinhas. Por enquanto, até para poder fazer uma avaliação legal do Blogger, estou trabalhando apenas com os recursos mais óbvios, e deixando este blog hospedado gratuitamente no Blogspot."
Esta nota, publicada no dia 26 de agosto de 2001 sob o título "Este pode ser o começo de uma bela aventura", foi o primeiro post do meu blog internetc. Eu havia experimentado outras soluções antes, quase engrenei com o LiveJournal, mas foi no Blogger que encontrei a ferramenta prática e amistosa que me permitiu tomar gosto pela coisa.
Criado em 1999, o Blogger ainda estava em pleno desenvolvimento. O permalink -- o URL de cada post -- havia sido lançado em 2000, e os sistemas de comentários ainda eram feitos, e hospedados, por voluntários abnegados; o Blogger só viria a ter um sistema próprio em 2004, depois de ter sido comprado pelo Google. Até lá, usei uma quantidade de sistemas diferentes, até que um colega blogueiro, Fabio Sampaio, me ofereceu uma vaga no seu excelente Falou e Disse, do qual tenho saudades até hoje.
Até 11 de setembro de 2001, os blogs eram considerados web brinquedinhos. Aí houve o ataque terrorista aos Estados Unidos. Enquanto os sites dos jornais e das emissoras de TV saíam do ar, derrubados pelo excesso de tráfico, os blogueiros nova iorquinos contavam ao mundo o que estava acontecendo. Depois disso, ninguém mais achou que o blog, como ferramenta, era bobagem.
Mas , de uns tempos para cá, os blogs vêm perdendo muita força. Seu lugar como ponto de encontro -- "botequins virtuais" -- vem sendo tomado pelo Facebook, onde todo mundo é, de certa forma, blogueiro -- e todo mundo se esbarra automaticamente. Na época áurea dos blogs -- aí por meados da década 2000-2010 -- os blogs tinham listas dos blogs amigos, que visitávamos com maior ou menor assiduidade.
A blogosfera era mais singela e muito mais interessante, já que cada blog tinha o seu jeitinho particular de ser. Mas o mundo gira, a Lusitana roda e, mesmo com a pior interface da galáxia, o Facebook ganhou a parada, já que facilitou muito a interação entre quem escreve, quem lê e quem só quer marcar o local e o horário da próxima manifestação. Como todos os blogs, o internetc. também foi vítima da mídia social. As discussões vibrantes que aconteciam em suas caixas de comentários se transferiram para o Facebook, onde ganhou uma repercussão que nunca teve enquanto viveu solto no espaço.
No começo do ano, decidi acabar com o internetc., hoje hospedado no Wordpress. Decidi também esperar até agosto, para que ele pudesse completar 12 anos. Foi uma boa ideia, porque pude pensar mais sobre o assunto. Não teria coração para matá-lo de vez, mesmo porque ele ainda tem seu uso: é ótimo como repositório de textos. De modo que resolvi mantê-lo no ar para republicar as colunas daqui do jornal e um ou outro texto solto, desabilitando, porém, as caixas de comentários. Ninguém consegue manter Twitter, Facebook e blog e ter, ao mesmo tempo, uma vida longe do computador.
Meu amigo Jean Boechat, outro blogueiro das antigas, comentava no Twitter, ainda outro dia:
"eu digo desde sempre. frase do @tonydemarco. eu tenho um blog morto que completará 13 anos, acho. haha."
(O Globo, Economia, 3.8.2013)
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