O
casamento entre um homem e uma mulher e entre pessoas do mesmo sexo está cada
vez mais parecido, nos EUA, conforme as histórias que desenrolam nos tribunais
do país. A união entre duas mulheres, por exemplo, já percorre os mesmos
caminhos do casamento tradicional nos tribunais: o casal comparece perante o
juiz para se casar e, mais tarde, para se divorciar e discutir a custódia dos
filhos.
Só
há um fato novo, que diferencia o casamento tradicional do casamento entre
lésbicas: a mulher tem de buscar seu direito à “paternidade”, quando necessário.
Até agora, o termo “maternidade” só aparece na legislação americana para fins
trabalhistas, quando se refere à licença-maternidade.
No
último capítulo de uma dessas histórias judiciais, em New Hampshire, uma
homossexual perdeu seu direito à “paternidade” para o atual marido de sua
ex-parceira em um tribunal, mas a recuperou na corte superior do estado.
De
acordo com a decisão do tribunal superior,
a lei de New Hampshire estabelece que “um homem é presumidamente o pai de uma
criança se: (...) a criança, que ainda não atingiu a maioridade, é recebida por
ele em sua casa e é considerada por ele como seu(sua) filho(a)”.
O
tribunal decidiu, por unanimidade, que essa presunção de paternidade se estende
a pais do mesmo sexo, mesmo que os “pais” sejam mulheres, pois “pai” + “mãe” =
“pais”, na matemática do idioma. O Direito, diz a decisão, inclui um “pai” —
mesmo que mulher — sem qualquer ligação biológica com a criança. E mesmo que a
mulher, no caso, nunca tenha sido casada legalmente com sua parceira.
Segundo
os autos, Susan B e Melissa D viveram juntas desde 1997. Em 1998, celebraram uma
cerimônia de compromisso, pois o casamento entre pessoas do mesmo sexo ainda não
era legalizado em New Hampshire à época, e decidiram construir uma família. Em
2002, Melissa teve Madelyn, que foi registrada como filha das duas mulheres. O
nome de Susan, então apontada como guardiã, está nos documentos do jardim de
infância e nos registros médicos da menina.
Susan
montou um berçário na casa que ela e Melissa compraram juntas e estava na sala
durante o parto de Madelyn. Quando a menina cresceu, Melissa se tornou a “mommy”
e Susan a “momma”. “Amei Maddie como minha filha, a criei como minha filha e
sempre a vi como minha filha”, ela escreveu em sua petição à corte.
Madelyn
tinha seis anos quando o casal terminou o casamento. Logo a seguir, Melissa se
casou com um homem, que passou a tratar Madelyn como filha. No ano passado,
Melissa moveu uma ação judicial para extinguir a guarda de Susan, para que seu
marido pudesse adotar Madelyn como filha, oficialmente. Ela alegou que Madelyn
não queria mais ver Susan e parou de descontar os cheques que a ex-parceira
enviava mensalmente, como pensão alimentícia.
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Na
Vara de Família, o juiz determinou que Susan não tinha direito de paternidade
sobre Madelyn e rejeitou a petição de Susan pelo reconhecimento da paternidade.
Mas o tribunal superior de New Hampshire anulou a decisão este mês, e confirmou
o direito de Susan à “paternidade”.
“Dois
adultos, Melissa e Susan, intencionalmente trouxeram Madelyn ao mundo e a
tiveram como a filha do casal. Não podemos ler a lei tão estreitamente, ao ponto
de negar a Madelyn a legitimidade de sua paternidade — nem seu direito a suporte
— de suas duas mães”, escreveu o ministro Gary Hicks, em nome de um painel de
cinco ministros do tribunal superior do estado. “Observamos que a intenção do
marido de Melissa de adotar Madelyn não altera nossa visão”,
acrescentou.
De
acordo com a decisão, presunções de paternidade atribuem grande peso ao
relacionamento familiar desenvolvido entre um pai e uma criança, após anos de
convivência. “Em um caso diferente, rejeitamos a alegação de um demandado, a mãe
biológica da criança, de que o demandante não poderia ser um ‘pai’, segundo a
lei, porque ele não atendia à definição do dicionário de que pai “é alguém que
gera ou produz a prole”, escreveu o ministro.
João Ozorio de Melo é
correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados
Unidos.
Revista
Consultor Jurídico, 13 de julho de 2014
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