segunda-feira, 15 de julho de 2013

Reflexões 1 - Quem são os Culpados?


Ari Francisco Brabosa Filho - advogado e professor universitário

Um dos traços característicos da cultura brasileira é a capacidade de esquecer fatos marcantes. Somos um povo com memória, sem lembranças.  Essa lógica do conformismo contradiz o ditado popular que diz: aquele que  bate esquece, mas o que apanha guarda a marca para sempre. O grande historiador Sergio Buarque criou a expressão “ homem cordial “ que  para alguns simboliza a disponibilidade do brasileiro em aceitar passivamente todas as situações, até as mais adversas;  uma outra  interpretação  que se faz é que o brasileiro não define com precisão a fronteira entre  coisa pública da coisa privada, tendo daí nascido o famoso jeitinho brasileiro e talvez o nascedouro da corrupção. Há ainda a  interpretação deturpada  que na verdade seria uma suposta fragilidade de conceitos morais que tornam o brasileiro excessivamente complacente com os erros alheios. Essas explicações pseudo-sociológicas,  porque provêm de dados empíricos ou reflexões preconceituosas, ajudam a compreender a desvalorização histórica do passado e pouco aprendizado que se tem da história brasileira, desde as capitanias hereditárias, passando pelo regime imperial e desaguando com intensidade ainda maior na república. Mesmo a república entra nesse roldão de paliativos, lembrando que já se teve  república velha, república nova que   não é necessariamente a atual, ainda que repita os mesmo equívocos dos sistemas políticos anteriores.
A linguagem jurídica usa a expressão vício de origem quando a raiz  do erro  decorre de um  momento inicial, distante,  muito anterior à causa que se julga no momento. Pode-se dizer que a sociedade brasileira tem vício de origem de responsabilidade. Numa visão mais aguda, o vício estaria no após descobrimento, quando se trouxe,  como primeiros habitantes  para povoar a terra, presos políticos e gente sem qualificação da terra portuguesa para cá. Sem dúvida não é o melhor início para qualquer  nação e isso  seria determinante no comportamento do brasileiro. Em outra linha, o vício de origem estaria no distanciamento que sempre houve entre governantes e governados, historicamente senhor e empregado. De novo, a história está recheada de exemplos.
Tem-se aí  o distanciamento entre povo-política-nação. A verdade é que poucas vezes em nossa história a participação popular foi efetiva. Dito de  outra forma, nunca houve cobrança de responsabilidade de governantes. Quando os desafortunados sem nome e sem riqueza reclamavam, aí  vinha a lei  de forma rápida e cruenta. Sempre foi assim, que sintam  os atuais manifestantes. Afinal, nesse contexto, a importância do povo só aparece nas eleições, através de um  ato delegativo de poder aos viciados políticos e seus indicados, parentes, amigos, empresários financiadores, já perfeitamente ajustados à lógica dos partidos e  uma vez eleitos, irão  sustentar e aumentar  classe política , de origem nada elogiativa na sociedade brasileira. Esse distanciamento que se tem dos atos políticos não significa desinteresse; é antes  de tudo resultado de toda uma história de dominação cultural, de um sociedade extremamente preconceituosa em que a distribuição da riqueza sempre esteve horizontalizada, circulando  nas grandes  famílias, da época imperial até o presente. Não é estranho o fato de que cerca de sessenta e sete sobrenomes dominem todo o cenário econômico- social do Brasil.  Nesse contexto, a   ascensão social do cidadão sempre foi sutilmente delimitada. Os avanços são contidos pela lógica dos acordos, da cordialidade e as  concessões que  se fazem nos momentos de crise não alteram a estrutura social. Porque se antes os líderes eram formados na elite para manterem o poder, hoje, é a  classe média que imita as elites na manutenção dos direitos sociais. Principalmente o direito à qualidade da educação. Não. A educação não é a culpada! Mas quem a faz ...

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