segunda-feira, 27 de junho de 2011

Saiba como conduzir uma separação sem desestabilizar emocionalmente os filhos

DANIELA VENERANDO
Colaboração para o UOL

Quando os pais se esforçam para preservar a criança, o impacto da separação para os filhos é bem menor

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No Brasil, 20 milhões de crianças e jovens de até 17 anos são filhos de pais separados. Para eles, o fim do casamento dos genitores representa um dos períodos mais difíceis de suas vidas. O processo de separação é sempre doloroso para o casal e para os filhos, com fortes sentimentos de culpa, dor e abandono. É uma fase em que a criança precisa se adaptar a muitas mudanças, como passar a viver sem a presença constante de um dos pais, ter duas casas para dormir, mudar de bairro e, eventualmente, trocar de escola e de amigos. Geralmente, os ânimos do ex-casal estão exaltados e os sentimentos acabam desestabilizando emocionalmente os filhos.

"O problema não é a separação em si, mas a forma como ela é conduzida. As crianças costumam sofrer mais danos psicológicos nas separações litigiosas em que os processos são longos, há muitas discussões e a criança é usada como troféu", afirma a advogada e psicóloga Verônica Cezar-Ferreira, autora de "Família, Separação e Mediação — Uma Visão Psicojurídica" (Editora Método).

O médico Haim Grunspun, que publicou os primeiros livros no Brasil sobre psiquiatria da infância, acompanhou um grupo de crianças, por dois anos, após o fim do casamento dos pais. Em sua conclusão, uma separação mal conduzida tem um potencial devastador. Segundo a pesquisa, os bebês, até os dois anos, podem ser mais medrosos e apresentar sintomas de regressão. As crianças com quatro e cinco anos tendem a encarar a separação como temporária e acham que podem influenciar no comportamento dos pais. Já os de cinco a seis anos costumam se sentir culpados, achando que provocaram o atrito entre o casal.

A princípio tudo pode parecer uma tragédia, mas, se você estiver passando por uma separação, respire fundo, porque os danos podem ser minimizados quando há um esforço dos pais em preservar a criança. É preciso transmitir que a ruptura é do casal e não com os filhos. "O primeiro passo é separar a vida conjugal da parental. O elo do casal se rompeu, mas os dois devem estar unidos num só objetivo: criar os filhos", aconselha a advogada Lia Justiniano dos Santos, especialista em direito de família. Acompanhe alguns erros comuns e as soluções para a nova família viver em harmonia e criar filhos emocionalmente saudáveis.

Problemas comuns
Guarda compartilhada.Conflito de lealdade.Diálogo.Alienação paternal.Boas regras

Guarda Compartilhada

Para muitos especialistas, quem mais ganha com a guarda compartilhada são as crianças, já que elas têm a oportunidade de manter o vínculo com ambos os pais. Nessa modalidade, reconhecida pela lei em junho de 2008, o pai e a mãe separados dividem direitos e deveres relativos aos filhos. No entanto, isso não significa, necessariamente, que haja convivência igualitária. Segundo dados da Associação de Pais e Mães Separados (Apase), 15 % dos pais separados têm a guarda compartilhada dos filhos, sendo que 97% dos filhos moram com as mães e 7% com os pais.

De acordo com o IBGE, esse número era apenas de 2,7% em 2003 e subiu para 4% em 2008. Depois da aprovação da lei, a modalidade de guarda compartilhada mais do que triplicou. Nas últimas três décadas, a mulher avançou no mercado de trabalho e os homens tornaram-se mais participativos no cotidiano da casa e na educação dos filhos. Desde 1975, a guarda compartilhada vigora nos Estados Unidos e há mais de 20 anos em países da Europa.

“Na separação, muitos pais já não se contentam mais em ver os filhos a cada 15 dias durante os finais de semana e desejam participar mais na vida da prole”, afirma o presidente da Apase, Analdino Rodrigues Paulino. E as vantagens não atingem só o pai. A mãe, menos sobrecarregada, também ganha mais tempo para si.

Conflito de Lealdade

Praticamente toda criança passa pelo conflito de lealdade. Nesta situação, a criança fica vulnerável à separação dos pais e passa entender, erroneamente, que não é possível amar ou agradar pai e mãe ao mesmo tempo. É comum problemas surgirem no período de transição entre as casas dos genitores. A mãe ou pai faz chantagem emocional e fica triste quando a criança sai para a visita, por exemplo. Com isso, a criança fica confusa ao achar que deve escolher ou tomar partido de um dois.

Para agradar o adulto, diz frases como: “Eu prefiro ir morar com você”; “Eu gosto mais de você”; “Papai me dá muita bronca”. Os adultos, sem perceberem, passam suas ânsias e desejos à criança e ela passa a confirmar o que o adulto deseja escutar. “Isso é péssimo e prejudicial. Pai e mãe são as figuras mais importantes para ela, que tem o direito de amar os dois”, explica a psicóloga jurídica e mediadora Tamara Brockhausen, especialista em alienação parental.

Segundo ela, esse comportamento só faz crescer o sentimento de culpa consciente e inconsciente na criança, que pensa: "Se eu agrado um, estou traindo o outro". Outro inconveniente é que, nessa divisão, o filho pode querer controlar seus pais e manipular situações, criando uma competição entre os adultos e, dessa forma, obter vantagens, como um brinquedo. Não é raro a criança ameaçar a se mudar para casa do outro pai se o um não faz as suas vontades.


Diálogo

Se não houve comunicação para manter o casamento, imagine depois da separação. Muitos casais nem sequer se falam e ainda estão imersos de raiva um pelo outro. Nessa situação, muitos pais tranformam os filhos em espiões e mandam recados ao ex-cônjuge.

“Mande e-mail, telegrama, seja o que for, mas não use a criança para mandar recados ou trazer informações. Caso contrário, ela vai ficar no meio de conflitos e preocupações que não lhe dizem respeito. É muito peso para uma criança que vai sofrer com o sentimento do conflito de lealdade”, diz a psicanalista Eliana Riberti Nazareth, autora do livro "Mediação – O Conflito e a Solução (Editora Artepaubrasil)".

“Os pais não precisam ser amigos, mas eles devem se esforçar em respeitar um ao outro, nem que seja em nome da criança”, acrescenta. Nesses casos, uma saída pode estar no mediador familiar. Trata-se de uma pessoa imparcial que vai ajudar o casal a organizar o cotidiano da nova vida, facilitar a comunicação entre os pais sobre a educação e o futuro do filho, a fim de evitar desgastes emocionais.

Alienação Parental

Falar mal do ex-cônjuge, dificultar o contato da criança ou adolescente com o pai ou a mãe, esconder informações pessoais relevantes sobre o filho são alguns exemplos da chamada alienação parental. Nessa situação, a criança é manipulada por um dos pais, após a separação, para se voltar contra o outro genitor. Quando torna-se persistente, pode se constituir em prática de violência psicológica infantil. O genitor aproveita a vulnerabilidade da criança após o divórcio para explorar e aumentar seus conflitos, alinhando a criança ao seu lado.

"Para o alienador típico, só ele sabe cuidar do seu filho e não precisa de outro, que ele julga incapaz ou prejudicial ao desenvolvimento da criança, quando, na realidade, é um bom genitor", diz a psicóloga jurídica Tamara Brockhausen. Segundo ela, é comum que este tipo de pai ou mãe desautorize o outro de sua função parental, o que gera problemas mais sérios nos filhos, como dificuldade em lidar com frustrações e aceitar limites.

Comentários negativos afetam o amor próprio dos filhos, pois eles deduzem: “Se meu pai (ou mãe) é uma pessoa má, eu também sou, porque sou filha dele”. A relação entre os ex-cônjuges deve permanecer diferenciada da relação que os adultos mantém enquanto pais. Um tipo de situação comum ocorre quando um dos genitores diz ao filho: "Ela (e) nos abandonou", revelando a confusão nos papeis familiares arrastando os filhos a fundo nos conflitos do pós-divórcio. Muitas vezes, em razão da mágoa, é difícil para os genitores perceberem como participam deste tipo de situação, por isso um profissional pode ajudar.

Desde agosto de 2010, esse tipo de comportamento passou a ser punido por lei. O pai ou mãe poderá receber advertência ou até perder a guarda da criança ou adolescente. Nas ações judiciais em vara de família, a prova de alienação parental mais importante, geralmente, é a avaliação psicológica realizada pelo perito, que é psicólogo.

Boas Regras

Seguir certas regras certamente facilitará o convívio e fortalecerá a relação dos filhos com os pais. Veja algumas:

- No caso da guarda compartilhada, é preciso um mínimo de tolerância, respeito e boa vontade para dar certo. Afinal, a rotina de trocas pode se transformar em mais motivos para brigas. Pai e mãe devem ter disponibilidade e disciplina para cumprir tarefas do dia a dia, como levar à escola e zelar pelos horários de sono e refeições.

- Ambos os pais devem acompanhar o desenvolvimento escolar da criança e decidir se vão às reuniões escolares juntos ou em dias alternados. O mesmo vale para as atividades extracurriculares, como a apresentação de balé ou do judô. Quando pai e mãe comparecem juntos, devem se tratar com respeito.

- Rotina traz segurança à criança. O filho pode ter o seu cantinho em duas casas, mas a recomendação é que exista uma coerência de regras pré-estabelecidas entre o ex-casal.

- É fundamental manter os eventos sociais familiares, de ambas as partes. Se o dia de uma festa calhar de ser em final de semana ou dia em que o combinado seja estar com o outro pai, é hora de negociar encontros substitutos.

- É importante que a escola seja informada do que está se passando em casa. É comum que o desempenho escolar da criança caia, que o seu comportamento torne-se mais agitado e suas atitudes mais agressivas com amigos e professores.

- A criança não deve ser exposta a brigas e opiniões divididas para não aprender a se relacionar apenas por meio do conflito, com o risco de afetar seus relacionamentos amorosos no futuro.

- É importante deixar a criança expressar sua tristeza. Além de falar, a criança deve ter outras maneiras de extravasar os sentimentos, como, por exemplo, a prática de um esporte, atividades artísticas e até de brincadeiras.

- Algumas crianças apresentam sintomas de regressão, como voltar a fazer xixi na cama. Podem demonstrar raiva, angústia, agressividade, ter choros frequentes e birras mais acentuadas, alterações de sono e de apetite, dores de cabeça, vômitos e febres. Preste atenção nisso.

- A divisão sobre Natal, Ano-Novo, férias e feriados devem ser combinadas em conjunto.Se eles forem mais crescidinhos, os pais podem considerar as vontades dos filhos, mas não deixe a responsabilidade da escolha com eles.


do site do UOL

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