Como disse
Paulo Freire, é a Marcha da Decência!
Estamos vivenciando momento
histórico no nosso Brasil. País gigante que se mobiliza a partir dos jovens e
contagiando a todos que se interessam pelas melhoras. A emoção do movimento,
que aumenta a cada dia e não é coisa passageira, começou com a gota d’água do
aumento do preço das passagens. Não são somente os 20 centavos, mas o pote
cheio de mágoas e direitos desrespeitados.
A mobilização gerada pelo julgamento
do mensalão em que o povo se sentiu de alguma forma prestigiado, a despeito de
qualquer discussão técnico-jurídica sobre o tema, demonstrou que a sociedade
queria correspondência aos seus anseios.
Dizem não haver liderança ou lista
de reivindicações por parte dos que marcham. Essa conclusão simplista deixa de
acompanhar a recente história do país e as reclamações não ouvidas ao longo dos
últimos tempos pelos brasileiros.
Os
gritos contra a representação na Comissão de Direitos Humanos da Câmara
Federal, que agora mesmo aprovou a proposta para suspender resolução do Conselho Federal de
Psicologia que veda a colaboração dos profissionais para o que denominam “cura
gay”. O projeto de lei continua avançando apesar dos protestos e da notória
inconstitucionalidade por ferir os direitos fundamentais previstos na
Constituição.
Os gritos contra o Estatuto do Nascituro que prevê
auxílio mensal à vítima do crime, a gestante estuprada, se deixar de
interromper a gravidez, como a lei lhe permite, em notória violação à
Constituição e aos Direitos Humanos, para reconhecer a paternidade do
criminoso, em afronta a toda evolução histórica dos direitos feministas e a
proteção das crianças e das famílias, concedendo supostamente direitos ao
nascituro, e não sua proteção como prevê a nossa lei, pois, na verdade, busca
impor crenças privadas a toda sociedade plural que não as compartilha em
prejuízo real à saúde da mulher, num paradoxo de proteção quando se sabe que
inúmeras mulheres morrem vitimadas pelo aborto clandestino ou sofrem durante
muitos meses na peregrinação para realizar a interrupção da gestação quando
assegurada por lei, e muitas vezes obstruída na prática.
Os gritos contra a PEC 33 que determina que a decisão do
STF sobre inconstitucionalidade de uma emenda constitucional seja submetida à
avaliação do Congresso Nacional que ao apresentar oposição deverá submeter a
questão à consulta popular, em clara tentativa de reduzir o equilíbrio entre os
três Poderes.
Os gritos contra a PEC 37 que retira do Ministério
Público o poder de investigação deixando exclusivamente para a polícia, o que
prejudica a apuração de crimes, especialmente desvio de verbas, corrupção e
abusos praticados por agentes do Estado e violações de direitos humanos.
Os gritos da antiga reivindicação de boas escolas,
hospitais com estrutura suficiente para atender à população, pagamento digno
aos professores e médicos para que o povo tenha garantido seu direito à
educação e saúde. Cansados, todos, de ouvir notícias de morte por falta de
atendimento médico, das emergências lotadas, das cirurgias marcadas para datas
distantes, dos medicamentos não recebidos, da hospitalização no chão dos
corredores de lugares imundos, da falta de equipamento, da falta de material de
sutura...
Os gritos das inúmeras crianças que ainda não sabem ler
ou que leem, mas não entendem o que leram, que não sabem somar ou multiplicar,
que não tem comida em casa ou na escola, que seu professor ganha tão pouco que
não consegue continuar a estudar, que frequenta uma escola quebrada e suja....
Os gritos contra a lentidão da Justiça que deixa de dar
soluções ágeis com processos que duram anos e até décadas para ter uma solução
definitiva e decisões que muitas vezes não são cumpridas nem para prender quem
deve ser preso ou para soltar quem está preso injustamente ou para fazer uso de
um bem ou receber o direito que lhe é devido.
Os gritos contra os gastos estrondosos com a construção
da estrutura da Copa do Mundo e a ausência de investimentos estrondosos nas
escolas, hospitais e transporte público.
Os gritos dos jovens estudantes, muitos presos em
atitudes assustadoramente arbitrárias, que responderão a investigação criminal
podendo ser processados criminalmente, acusados de formação de quadrilha, por
serem perigosos, pois estavam reunidos com outros jovens reivindicando seus
direitos civis e tem suas fotos divulgadas com camisetas de presos, apesar de
serem jovens universitários com consciência política, lutando pelo que
acreditam.
Os gritos dos jornalistas impedidos de atuar na cobertura
dos fatos; os fotógrafos impedidos de registrar os momentos históricos
importantes afastados com tiros de bala de borracha, gás lacrimogêneo e spray
de pimenta, presos por portarem vinagre para se protegerem contra as armas não
letais, como se o uso destas justificasse a ausência de tentativa de diálogo.
A pauta é imensa, os gritos são muitos, ainda há dúvidas
quanto ao que se reivindica?
Estes jovens estudantes conseguiram, com o uso da
internet, mobilizar fisicamente parte da sociedade e motivar imensamente outra
parte, são jovens que tiveram a oportunidade de estudar e formar senso crítico
para ver o que está acontecendo e se posicionar contrariamente, conscientizando
outros cidadãos. E mais. Se dispuseram a ir para as ruas gritar ainda mais, sem
que qualquer partido, neste momento, os represente porque até agora não deram
ouvidos. Gritar até que os governantes, os políticos, se aproximem para ouvir e
para responder, falando olhando nos olhos, de perto, como falaram no momento
das campanhas eleitorais. Cumprindo com o dever de representar a população, no
todo, eleitores ou não.
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