terça-feira, 25 de junho de 2013

Do Sorriso à Indignação




Ari Francisco Brabosa - Advogado e Professor Universitário



Um dos indicativos da consciência de vida é a capacidade de sorrir e se indignar. Sorriso e indignação representam a bipolaridade, os contrários que se opõem e só  sobrevivem exatamente por serem essa opostos, forçando a regulação de suas forças. O atual momento brasileiro reflete essas forças. À primeira vista, esse vigor juvenil sem precedentes surpreende a todos ao dizer em alta voz tudo que se diz em casa, nos bares, nas filas, nas praias, no trabalho: tem corrupção em tudo! Como se, de repente, se entendessem as razões de tanta revolta, tudo que precisava ser ouvido. O poeta sublimava as confissões de amor que morriam na garganta. No garganta  de todos os brasileiros estavam adormecidas reclamações de tanta dívidas que se acumularam ao longo do tempo. Dívidas históricas, dívidas sociais, dívidas econômicas. Não há marco inicial. Remontam ao tempo os privilégios e opressões, cuja maioria, os livros de história não registram, que é mais uma dívida, talvez a maior delas. E não se diga que não tenha havido oportunidades de resgate. A independência, o fim da escravidão, a república, a constituição, momentos em que a esperança ficou mais forte e embalou o velho gigante. E  tudo ficou na garganta.
            Nesse momento nas ruas  explodiu a garganta do  povo e ninguém sabe o que vai acontecer depois. A física ensina que todo movimento tende a fadiga sendo precisa outra força para alimentá-lo. Como o leite fervido que extrapola os limites da panela em influxo, não se dá o refluxo até o esgotamento total, até queimar a panela, o fogão, a casa, as pessoas, a rua, a cidade, o país  ...  
            A alegria e espontaneidade dos jovens converteu-se em indignação. O sorriso virou raiva. Excludentes das decisões políticas, da vida cotidiana, da saúde, da educação, do transporte público, dos projetos sociais, das decisões jurídicas, tudo isso emoldurado por uma mídia comprometida, vestida rosa e de ídolos, esses jovens,  ausentes de partidos, juntaram-se aos da classe média, ainda que não atingidos pela exclusão social,  comportados ou não, todos, de repente, carentes de participação, expectadores de decisões políticas, fundiram num grito único de revolta. A voz das ruas sabe o que não quer, e isso explica a ausência de liderança, porque a liderança, no momento brasileiro, é organização, racionalidade, comprometimento com a mentira, a corrupção, o deboche. Tem-se uma democracia, representativa na forma, delegativa na finalidade. O poder foi delegado a quem não quer representar, antes usufruir para seu grupo, seu partido, sua organização. E o povo, essa entidade abstrata, delegou poder concreto a uma classe política que faz uso, consciente, da coisa pública para o fim privado. Por isso, a indignação ganhou do riso, encheu a rua, trouxe à praça o tamanho da dívida. Que os culpados paguem a conta!

            

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