Autora: Maria Aglaé Tedesco Vilardo
O termo alienação parental significa a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida pela mãe ou pelo pai, ou por quem esteja exercendo os cuidados com a criança ou adolescente, para que repudie o outro genitor ou cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
A lei traz exemplos de atos praticados como: realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; dificultar o exercício da autoridade parental; dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; omitir deliberadamente do genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
Diversas situações ocorrem que caracterizam a alienação. As destacadas pela lei são apenas as mais comuns. Deverá ser avaliado se a atitude do guardião tem como propósito afastar o outro genitor de participar e conviver com seu filho.
Para confirmar que a alienação parental ocorre será necessária investigação pericial. Poderá ser nomeado psicólogo para realizar estudo do caso e concluindo pela existência de alienação o juiz determinará, com a devida urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente. Estas medidas deverão assegurar a convivência do filho com o genitor ou a reaproximação entre ambos quando estiverem afastados. Esta reaproximação poderá ser gradativa e iniciada com apoio de psicólogo no próprio Forum ou em local a ser designado pelo juiz podendo ser determinado um acompanhamento por profissional ou outra pessoa, para que ocorra a adaptação da criança.
Se a criança vinha sendo vítima de alienação parental poderá estar abalada psicologicamente e até rejeitar a figura do outro genitor, o que justifica o acompanhamento profissional.
O estudo social é relevante para contextualizar a vida familiar da criança e o que levou à alienação ou sua tentativa, por isso o trabalho do assistente social também será importante para o deslinde da questão.
Os pais serão ouvidos pelos peritos (assistente social e psicólogo), bem como a criança se puder se manifestar. Documentos que demonstrem a ocorrência da alienação, como e-mails, poderão ser juntados aos autos do processo. O histórico do relacionamento do casal e da separação, as discussões e brigas e suas motivações, a avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor, tudo deverá ser objeto de estudo e bem examinado para que haja proteção efetiva da criança.
Apesar da lei fixar o prazo de 90 dias para vinda do laudo do perito certamente em casos com maior urgência esse prazo poderá ser reduzido. Da mesma forma, em casos que exijam estudos mais elaborados o prazo poderá ser ampliado para que mais entrevistas sejam realizadas ou para se verificar como a situação evolui com o tempo. Nada impede que sejam repetidos os estudos se houver necessidade.
Caracterizada a alienação parental poderá ser apurada a responsabilidade civil do alienante ou até mesmo a responsabilidade criminal, pois a alienação pode implicar na prática de crimes a ser apurado pelo Ministério Público.
Havendo dificuldade na convivência da criança com o genitor caberá ao juiz fazer determinações para amenizar a dificuldade de convívio e inibir seus efeitos perniciosos. O juiz poderá advertir o alienador; ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; fixar multa ao alienador; determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; declarar a suspensão da autoridade parental. Cada uma destas medidas deverá ser bem analisada, principalmente alteração da guarda ou inversão, mudança de domicílio da criança e suspensão da autoridade parental, pois a criança deve ser protegida de maiores conturbações e violência psicológica.
Caracterizada mudança abusiva de endereço, como por exemplo mudança para outra cidade com o notório objetivo de inviabilizar a convivência familiar, o juiz também poderá determinar que o guardião que se mudou passe a ter a obrigação de levar a criança para a cidade onde se encontra o outro genitor em dias determinados de convívio/visitação e arcando com as despesas do deslocamento.
Preferencialmente deve ser fixada a guarda compartilhada. Isso porque o código civil assim determina. Porém, não havendo possibilidade por qualquer motivo para que a guarda compartilhada seja fixada, deverá ser fixada a guarda unilateral para aquele genitor que viabilize a efetiva convivência da criança com o outro genitor.
A ação para regulamentação do convívio entre pais e filhos tem como regra tramitar na Comarca onde a criança reside com seu guardião. Esta regra foi modificada pelo art. 8º da lei de alienação parental no caso da criança ser levada para outra cidade, permitindo ao genitor alienado propor a ação judicial na cidade onde a criança residia anteriormente. Esta exceção poderá ser questionada pelo guardião da criança e o juiz deverá decidir sobre a competência sopesando se o trâmite do processo será mais benéfico na Comarca de nova residência ou na de residência anterior. Por vezes a mudança de cidade visa dificultar o outro genitor a ingressar em juízo, por isso a opção oferecida pela lei.
Os artigos vetados por manifestação do Ministério da Justiça dizem respeito à utilização da mediação nos casos de alienação parental e tipificação de crime específico.
A possibilidade de mediação foi retirada da lei com a justificativa de ser o direito da criança e do adolescente à convivência familiar indisponível, o que não permitiria sua apreciação por mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos. Este é um entendimento equivocado, pois a mediação não realiza apreciação do conflito, mas atua no sentido de minimizar o conflito entre as partes. Não há na legislação vigente qualquer impedimento legal para que o juiz encaminhe tais casos à mediação independente do veto ocorrido. Ao contrário, o próprio Ministério da Justiça apresentou projeto de mediação para implementação nos Tribunais que já apresenta bons resultados especialmente na área de família e direitos da infância e adolescência. Portanto, o juiz poderá encaminhar estes processos à mediação.
O outro argumento apresentado para o veto menciona a aplicação do princípio da intervenção mínima, segundo o qual eventual medida para a proteção da criança e do adolescente deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável. Isto também não cria embaraços para a mediação. As partes podem, através da mediação, comprometerem-se a realizar acompanhamento psicológico, a não mudar de residência, bem como fixar cláusula de reversão de guarda em caso de descumprimento do direito de visita/convívio. Tais cláusulas previstas de comum acordo entre as partes são legítimas, claro desde que não causem qualquer prejuízo à criança.
No tocante à criminalização da prática de alienação parental, o veto é justificado em razão de que a inversão da guarda, a multa e a suspensão da autoridade parental seriam suficientes para inibir os efeitos da alienação parental. O argumento é correto, mas cabe ressaltar que os tipos penais existentes já alcançam a prática de atos graves como a falsa denúncia de abuso sexual que caracteriza o crime de calúnia, bem como maus tratos praticados contra criança, sejam de ordem física ou moral, com específica previsão penal.
Em suma, o que se percebe é que o legislador condensou na nova lei os inúmeros mecanismos que existiam para que seja combatida esta forma mesquinha de se exercer a guarda de uma criança. Dispostos assim e efetivamente aplicados poderão ser instrumentos de proteção às crianças que vivam sob forma de coação por parte daqueles que têm o dever de proteger e não de subjugar.
Um comentário:
Excelente explanação. gostaria de saber se há como os padrinhos da criança entrar com ação para visita-la a partir do momento que a mãe não permite contato da crianças com os tios que são os padrinhos.
Agradeço.
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