quarta-feira, 28 de maio de 2014

MP é parte legítima para ajuizar ação de alimentos em favor de menores


O Ministério Público é parte legítima para ajuizar ação de alimentos e pode fazê-lo independentemente do exercício do poder familiar pelos pais, da existência de risco prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ou da capacidade da Defensoria Pública de atuar em favor dos menores.

A decisão é da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso repetitivo em que se discutia a possibilidade de o MP ajuizar ações que envolvem pensão alimentícia.

O recurso foi afetado como repetitivo no STJ por sua relevância. Milhares de ações discutem a legitimidade do órgão ministerial para atuar em favor de menores em todo o país. No caso julgado, a ação foi ajuizada em favor de duas crianças, uma de quatro, outra de nove anos, na comarca de Livramento de Nossa Senhora (BA).

O MP ingressou em juízo para que o réu contribuísse para o sustento dos filhos com meio salário mínimo. No julgamento em primeira instância, o juízo extinguiu o processo sem solução de mérito por entender que o órgão carecia de legitimidade ativa para a propositura da ação.

Entendimentos divergentes

No próprio STJ não havia uniformidade sobre o tema. Segundo o relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, alguns precedentes eram no sentido de haver legitimidade do MP sempre; outros afastavam essa legitimidade quando a criança ou o adolescente se encontrava em poder dos pais; e outros precedentes eram favoráveis à atuação do MP desde que o menor se achasse em situação de risco.

A divergência entre os precedentes surgia da interpretação do artigo 201, inciso II, do ECA, segundo o qual compete ao MP “promover e acompanhar as ações de alimentos e os procedimentos de suspensão e destituição do pátrio poder familiar, nomeação e remoção de tutores, curadores e guardiães, bem como oficiar em todos os demais procedimentos da competência da Justiça da Infância e da Juventude”.

Segundo o ministro Salomão, os precedentes que negavam a legitimidade entendiam que esse artigo só se aplicaria nas hipóteses do artigo 98, que dispõe que as medidas de proteção são aplicáveis sempre que os direitos previstos no ECA forem violados ou ameaçados por ação ou omissão da sociedade ou do estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis; ou em razão da conduta do menor.

Constituição

Para o ministro, a solução da matéria não pode se restringir à interpretação dos mencionados artigos porque envolve as atribuições de ente que ocupa posição estrutural no estado e porque se trata da tutela de interesses de “especialíssima grandeza”, com os quais se preocupou a Constituição Federal.

O artigo 127 da Constituição dispõe que o Ministério Público é "instituição permanente, essencial à função jurisdicional do estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".

A opinião do ministro é que a legislação infraconstitucional que se propuser a disciplinar as funções do MP poderá apenas aumentar seu campo de atuação, mas nunca subtrair atribuições já existentes ou mesmo criar embaraços à realização de suas incumbências centrais, como a defesa dos interesses sociais e indisponíveis.

É da própria Constituição que se extrai a competência do órgão para atuar em favor dos menores, quando ela afirma que é dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde e à alimentação.

“Não há como diferenciar os interesses dos envolvidos para que apenas alguns possam ser tutelados pela atuação do Ministério Público, atribuindo-lhe legitimidade, por exemplo, em ações que buscam tratamento médico de criança e subtraindo-lhe a legitimidade para ações de alimentos”, disse o ministro.

O entendimento da Seção é que a jurisprudência deve seguir uma linha que favoreça o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social da criança e do adolescente, em condições de liberdade e de dignidade.

site STJ

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Já não era sem tempo! Primeira Mulher Negra eleita Desembargadora no Rio de Janeiro e por Merecimento

Na data de hoje, a Juíza Ivone Ferreira Caetano foi eleita pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro como desembargadora recebendo 19 votos, além de considerações elogiosas sobre seu trabalho junto à Vara da Infância e Juventude e Idoso da Capital. Sua eleição se deu pelo critério do merecimento.

Juíza pode se tornar a primeira desembargadora negra do estado

Juíza pode se tornar a primeira desembargadora negra do estado
Anúncio será feito nesta hoje, e, na lista de candidatos, o nome com maiores chances de promoção é o da juíza Ivone Ferreira Caetano, titular da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso

FRANCISCO ALVES FILHO

Rio - Mais de dois séculos e meio após sua criação, a Justiça do Rio pode ter, enfim, a primeira desembargadora negra. O anúncio será feito nesta segunda-feira, e, na lista de candidatos, o nome com maiores chances de promoção é o da juíza Ivone Ferreira Caetano, titular da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso. O Rio tem mulheres desembargadoras e tem desembargadores negros. Não há no cargo, porém, alguém que reúna as duas qualificações. Se a promoção se confirmar, Ivone, de 69 anos, será a segunda do Brasil nessa condição.

A juíza lamenta essa realidade. “É uma vergonha isso ser raridade em pleno Século XXI”, diz.

Tida como durona, Ivone é conhecida por decisões controvertidas como a internação compulsória de adolescentes dependentes de drogas e por obrigar adolescentes grávidas a se submeterem a tratamento médico. Quando fala de preconceito, não usa meias palavras. “Essa decantada democracia racial não existe”, afirma.






 A juíza Ivone Ferreira Caetano: "Não dou bola para o preconceito e sigo em frente fazendo o que tem que ser feito"
Foto:  Fernando Souza / Agência O Dia
A possível promoção a desembargadora só será confirmada no anúncio oficial, já que há outros candidatos. Mas, pelo critério de obter 13 votos em três eleições, Ivone é quem tem a melhor posição. Mais uma vez, seria pioneira no estado, já que há 20 anos foi a primeira mulher negra a passar em um concurso para a magistratura fluminense.
Desde então, ela avalia, o preconceito se manteve. Reconhece, no entanto, que houve avanços. “O negro está começando a ter autoestima e a gostar de si próprio”, acredita. “Está crescendo a consciência do meu povo”.
Ivone diz ter sido vítima de racismo várias vezes. Explica como enfrentou essas situações, fazendo analogia com a atitude do lateral-direito Daniel Alves em resposta a torcedores preconceituosos. “Só não digo que como a banana e limpo as mãos no calção porque minha área não é o futebol”, ironiza. “Não dou bola para o preconceito e sigo em frente fazendo o que tem que ser feito”. Além da segregação sofrida por causa da cor da pele, Ivone enfrenta os preconceitos contra a condição feminina. “Ser negra e mulher é muito difícil no Brasil”.
Caso o Tribunal de Justiça confirme a escolha, ela se considera à altura da tarefa. “Pode haver quem trabalhe tanto quanto, mas não mais que eu”. Filha de uma lavadeira que foi abandonada pelo marido e conseguiu criar 11 filhos, ela acredita que a possível promoção seria um avanço contra o racismo: “Isso sinaliza para os demais negros que sim, eles podem”

Em todo o Brasil, houve apenas um caso, na Bahia

Somente em 1998, o TJ-RJ teve o seu primeiro desembargador negro: Gilberto Fernandes. Mesmo hoje, são poucos. “Não se contam nos dedos de duas mãos”, diz a juíza Ivone Caetano. Em todo o país, há apenas uma mulher negra que chegou ao cargo de desembargadora. Filha de vaqueiro com uma costureira, Luizlinda Valois Santos foi nomeada na Bahia, em 2011.
"Pode haver quem trabalhe tanto quanto, mas não mais que eu"Ivone Ferreira Caetano, titular da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso
Uma das poucas pesquisas sobre o perfil da magistratura brasileira, feita pelo pesquisador Romeu Ferreira Emygdio, do IBGE, demonstra que o Poder Judiciário de Brasil reflete a segregação étnica que se repete em várias instituições. O estudo, com dados de 1980 a 2000, revela que 85,9%, dos juízes togados declaram-se de cor branca, havendo 14,1% não brancos. Apesar dos 14 anos de diferença, o pesquisador alerta que não há grandes diferenças dos últimos 400 anos de história do Brasil.

Muitas críticas por defender a internação compulsória

Para a juíza Ivone Caetano, o trabalho à frente da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso é a tarefa mais pesada no Judiciário. “Com o crack, os problemas nessa área têm crescido bastante”. Ela foi uma das primeiras autoridades a determinar internação compulsória para adolescentes dependentes de drogas que vivem na rua. Desde 2011, enfrenta críticas por isso.
Alguns argumentam que essa iniciativa fere o direito de ir e vir. “Aqueles que criticam não oferecem soluções para essa grave questão. Quem tem boa condição financeira pode internar o filho, enviar ao exterior para tratamento. Já os pobres podem ficar na rua, entregues ao tráfico?”
Ivone ressalva que é preciso garantir atendimento médico de qualidade. “Os adolescentes não devem ser jogados em um depósito de gente”.

Outro debate em que frequentemente é chamada a opinar: a discussão sobre redução da maioridade penal como medida para combater a criminalidade. “Por enquanto, eu ainda sou contra. Na minha opinião, a esses menores nada foi dado. Nem saúde, nem educação, nem ambiente digno de moradia. Então, pouco lhes pode ser cobrado”.
Sua atuação rendeu admiradores, mas também fez surgir adversários: teve contra si 19 representações (tentativas de punição). Nenhuma delas foi aceita. “Não sei se essas iniciativas foram por discordâncias legais ou apenas pelo objetivo de martelar a cabeça de um prego saliente (risos). Nunca poderão dizer que eu seja desonesta ou aja fora da legalidade”. Ela não se abala e mantém o foco. “Busco fazer o melhor pela criança e adolescente".                              





do site do Jornal O Dia



sexta-feira, 23 de maio de 2014

Audiência de Instrução e Julgamento na Vara de Família

autora: Maria Aglaé Tedesco Vilardo

DECISÕES JUDICIAIS - Clique para ler o artigo

Em postagem antiga falamos da audiência de conciliação na Vara de Família.

Nesta postagem apresentaremos a rotina de audiência de instrução e julgamento.

A instrução é a produção de provas para o convencimento do juiz. O julgamento é a prolação da sentença.

A audiência tem um objetivo simples que é produzir a prova ORAL. As demais provas não precisam de uma audiência.
Nesta audiência o juiz ouvirá as partes, através do depoimento pessoal. Somente o autor pode pedir o depoimento pessoal do réu. Somente o réu pode pedir o depoimento pessoal do autor. Isso ocorre porque a própria parte não precisa pedir para pronunciar-se. O que quiser dizer poderá ser por escrito.

O juiz inicia ouvindo o autor e permite ao advogado do réu fazer perguntas e, em seguida, as perguntas do promotor se estiver atuando (quando há menor de 18 anos ou pessoa maior de idade, mas incapaz).
Depois ouvirá o depoimento pessoal do réu e dará a palavra ao advogado do autor e ao promotor.

Se o autor faltar, no caso de ação de alimentos, a lei de alimentos determina o arquivamento. Na prática o processo é julgado extinto com a revogação dos alimentos provisórios.
Se o réu faltar, sendo ação de alimentos, quando teria que contestar em audiência, será decretada a revelia. O juiz colherá as provas que desejar e dará a sentença.

Nas outras ações, quando uma parte faltar, o juiz poderá colher os demais depoimentos. Se o advogado faltar injustificadamente poderá ouvir ou não as partes. Na falta justificada a audiência deve ser adiada.

Se a parte se recusar a depor serão considerados verdadeiros os fatos alegados pela outra parte. Quem ainda não depôs não deve assistir ao interrogatório da outra parte. A parte pode consultar notas breves, desde que objetivem completar esclarecimentos.

Depois de ouvir as partes, o juiz ouvirá as testemunhas. Em regra são até três testemunhas sobre cada fato, embora possam ser levadas até 10. É importante, que as testemunhas que tenham maiores informações prestem depoimento antes das demais, pois o juiz poderá indeferir a oitiva de mais de três testemunhas, caso seja sobre os mesmos fatos. O rol de testemunhas deverá ser apresentado até 10 dias antes da audiência. As testemunhas poderão vir independente de intimação, devendo constar tal informação no processo, ou serão intimadas pessoalmente.

Primeiro ouve as testemunhas do autor e depois do réu. Adverte a testemunha quanto ao compromisso de dizer a verdade sob pena de crime de falso testemunho. As testemunhas deverão ser qualificadas com nome, a profissão, a residência e o estado civil, bem como se tem relações de parentesco com a parte, ou interesse no objeto do processo. O advogado da outra parte poderá contraditar a testemunha – por incapacidade, impedimento ou a suspeição. No direito de família, normalmente a testemunha é um amigo ou parente e o juiz poderá perguntar se tem interesse no feito. O juiz poderá dispensar a testemunha ou ouvir como informante e atribuir ao depoimento o valor que achar cabível.

O juiz que colher os depoimentos deverá proferir a sentença no processo. Nas ações de direito de família é importante o contato com as partes, por isso, caso o juiz que presidiu a audiência não prolate  a sentença porque foi promovido, por exemplo, poderá ser marcada nova audiência para que o juiz que irá proferir a sentença tenha mais elementos. Por isso é muito importante que conste da ata de audiência todos os detalhes do que ocorreu, de forma resumida.

Quem preside a audiência é o juiz e somente este pode ditar o que vai constar da ata, porque será a sua assinatura colocada abaixo do relato. Caso a parte não queira assinar o juiz registrará na ata a recusa. O juiz tem o poder de polícia para manter a ordem e o decoro na audiência e dirigir os trabalhos. Poderá determinar que se retirem da sala da audiência os que se comportarem inconvenientemente; poderá chamar a polícia; proceder direta e pessoalmente à colheita das provas; exortar os advogados e o órgão do Ministério Público a que discutam a causa com elevação e urbanidade. A audiência deve transcorrer com tranquilidade sob a condução do juiz que deve evitar gritos ou discussões extremas, embora seja comum que as partes se emocionem na audiência de Vara de Família porque estão discutindo questões que envolvem seus sentimentos.

A audiência transcorre em segredo de justiça não podendo se assistida por estranhos, mas é comum que estagiários possam assistir.

A audiência preliminar prevista no art. 331 do CPC é muito comum nas ações declaratórias de união estável.  O juiz irá tentar a conciliação, ouvirá autor e réu e proferirá o despacho saneador. Fixará os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento para oitiva de testemunhas.

Caso seja arguido incidente de falsidade de documento na audiência, caberá observar o prazo previsto no art.390 do CPC, de 10 dias contados da juntada do documento. A parte contrária poderá retirar o documento ou o incidente será instaurado em apenso, suspendendo o processo.

Na hipótese de alguma decisão ser proferida em audiência, o advogado poderá interpor agravo retido.

O juiz ouvirá as razões, dará a palavra para a outra parte e ao promotor e decidirá entre manter o que decidiu ou reconsiderar. A decisão poderá ser tomada depois da audiência para melhor análise.

Após a oitiva da prova oral, o juiz deve perguntar se ainda há outras provas a produzir. Nada havendo, os advogados poderão falar em manifestação final.

O juiz poderá indagar se os advogados se reportam à inicial e contestação. Caso positivo, constará da ata. A seguir será dada a palavra ao promotor e proferida a sentença.

Caso o juiz se convença de que a parte não agiu de boa fé, como alterar a verdade dos fatos; ou usar do processo para conseguir objetivo ilegal, poderá aplicar multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa, conforme artigos 14 e 17 do CPC.

Como a prova é produzida para o convencimento do juiz, este poderá indeferir alguma prova que entender inútil, mas deverá consignar em ata e deverá sempre observar o direito à ampla defesa. Por isso, deverá justificar os motivos de seu indeferimento.

O juiz sempre poderá renovar a proposta de acordo, até antes de proferir a sentença.  Por vezes, após todo o transcurso da audiência, a parte se convence de que um acordo é mais favorável.




terça-feira, 20 de maio de 2014

Ser Juiz de Família

Aos novos juízes do TJRJ - 2014

Ser Juiz de Família é saber que toda família, inclusive a sua, está sujeita a chuvas e trovoadas.

Ser Juiz de Família é parecer que adora uma fofoca sobre a vida dos outros e perguntar na ação de alimentos porque a separação aconteceu.

Ser Juiz de Família é olhar dentro dos olhos do requerente para depois dizer que não pode dar o direito da forma que está sendo pedido e perceber a decepção.

Ser Juiz de Família é olhar dentro dos olhos do requerente para depois dizer que pode dar o direito como está sendo pedido e perceber o alívio que é sentido.

Ser Juiz de Família é perguntar se tem acordo e ouvir um não imediatamente como resposta.

Ser Juiz de Família é deixar as partes falarem, falarem, falarem e contarem a sua história e ainda dizerem algumas verdades, um para o outro e depois ver as partes fazendo um acordo.

Ser Juiz de Família é ter certeza de que o autor tem razão até que o réu fale para que se passe a ter certeza que a razão está com o réu.

Ser Juiz de Família é ver as mãos, daquele homem gigante que entra na sala de audiências, tremerem como criança.

Ser Juiz de Família é ver uma mulher pequena entrar na sala de audiências e ficar do tamanho do homem gigante para defender os direitos do seu filho.

Ser Juiz de Família é ver o autor trazer uma pasta cheia de papéis e documentos e explicar que tem direito e provar que tem direito e convencer o juiz a reconhecer seu direito.

Ser Juiz de Família é ouvir o advogado e ficar convencido do que está dizendo e na hora de dar a sentença ver que a prova diz exatamente o contrário, mas o advogado falou tão bem que dá até pena de não conceder o pedido dele.

Ser Juiz de Família é ouvir o autor com 80 anos te chamar de moça.

Ser Juiz de Família é ouvir o menino de 10 anos te chamar de senhora.

Ser Juiz de Família é ficar irritado de tanto ouvir testemunhas.

Ser Juiz de Família é ficar feliz de ouvir uma testemunha que esclarece todas as suas dúvidas.

Ser Juiz de Família é aprender a não falar alto com ninguém.

 Ser Juiz de Família é perguntar se os sorrisos entre autora e réu significam que estão voltando a viver juntos.

Ser Juiz de Família é ouvir a mesma frase dos pais todos os dias “se eu pudesse eu pagava muito mais de pensão alimentícia para meu filho”.

Ser Juiz de Família é ouvir que “eu posso até ser o pai, mas quero o exame de DNA”.

Ser Juiz de Família é na ação de execução de alimentos ouvir  “eu sempre paguei a pensão em dia” quando a dívida tem mais de cinco números.

Ser Juiz de Família é ouvir “eu sempre deixei ele ver meu filho”.

Ser Juiz de Família é ouvir “ela nunca me deixou ver meu filho”.

Ser Juiz de Família é perguntar quem fica com a máquina de lavar roupas.

Ser Juiz de Família é perguntar se tem como a mulher morar no primeiro andar com os filhos e o marido no segundo andar e ouvir que dá para fazer uma escada pelo lado de fora.

Ser Juiz de Família é fazer as contas das despesas dos filhos e o pai lembrar que a escolinha de futebol é paga por fora.

Ser Juiz de Família é decretar a prisão do pai que não pagou a pensão alimentícia e a mãe pedir para o juiz soltar porque ele não tem condições de pagar.

Ser Juiz de Família é sentir, a cada história de família, a mesma emoção que sentia quando ouviu as primeiras histórias há vinte anos atrás.

Ser Juiz de Família é ter vontade de abraçar a parte e dizer que tudo vai passar.

 Em homenagem aos meus vinte anos como juíza de Vara de Família

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Audiência de Divórcio na televisão - novela com toque de realidade

Finalmente assisto uma cena de audiência com base em situações mais reais. As audiências nas novelas e filmes costumam trazer muitas informações equivocadas.
No capítulo da novela Em Família de hoje, a audiência de divórcio de Branca e Ricardo teve muitos pontos positivos em termos do que acontece na vida real. Claro que o autor tem que imprimir um ritmo diferente.  As frases ditas por Branca são normalmente faladas nas entrelinhas pela mulher ou marido, mas o que ocorreu nesta cena tem mesmo relação com o que acontece na vida real.
A juíza marcou uma audiência de conciliação, o que não é comum para ação de divórcio, mas nada impede que ocorra. A pergunta inicial sobre a vontade real de separar ou a possibilidade de reconciliação não tem mais cabimento pela lei de hoje. Mas era exigência legal pelo código civil anterior que vigorou até 2002. Os juízes tinham que tentar a reconciliação! Alguns juízes deixaram de aplicar esta norma e não perguntavam às partes, mas muitos ainda o fizeram até 2002.
A explicação do advogado de Branca foi perfeita, bem como os esclarecimentos da juíza sobre o divórcio direto ser possível desde 2010. Casamento só é mantido enquanto os dois quiserem.
Genial a resposta de branca falando de suas crenças. Algumas pessoas confundem a lei civil com a religião, o que não deve ocorrer.
A parte mais interessante, do ponto de vista jurídico, foi o pedido de indenização de Branca. Sim, muitas vezes a parte se sente tremendamente injustiçada após anos de casamento  e convívio, cuidando da casa e dos filhos, dedicando-se integralmente ao outro e sendo abandonada. A sensação de abandono gera o desejo de indenização. Há muitos pedidos de indenização que receberam sentença favorável. Esta é uma discussão que ocorre até hoje, pois pergunta-se se é justo exigir uma indenização quando acaba o amor.
Processualmente o pedido deve ser feito em ação separada, mas não é muito comum. O autor da novela demonstrou bem, em rápidas palavras, o sentimento desta mulher.
Um detalhe, quando a juíza determina a vinda dos autos conclusos para sentença não caberia declarar o divórcio em seguida. A conclusão é a vinda dos autos para o juiz. Poderia sim decretar o divórcio  imediatamente. É uma sentença tão simples que poderia ditar ao serventuário que digitava a ata.  
                               
Aliás, outro aspecto corretamente representado, pois presentes a juíza e o serventuário sem que estivesse o representante do Ministério Público, pois o Promotor de Justiça não atua mais nos processos desta natureza em razão das partes serem maiores de idade e capazes.
Por fim a agressividade de Branca para com a juíza. Felizmente não é comum a atitude, mas acontece. Já vivi cena idêntica.
O autor e sua equipe acertaram nesta audiência. Parabéns aos pesquisadores!

Enunciados de Biodireito do Forum da Saúde - CNJ

ENUNCIADOS BIODIREITO 

Reflexos na filiação com relação à reprodução assistida e sobre mudança e sexo de transexual

ENUNCIADO N.º 37
As diretivas ou declarações antecipadas de vontade, que especificam os tratamentos
médicos que o declarante deseja ou não se submeter quando incapacitado de
expressar-se autonomamente, devem ser feitas preferencialmente por escrito, por
instrumento particular, com duas testemunhas, ou público, sem prejuízo de outras
formas inequívocas de manifestação admitidas em direito.
ENUNCIADO N.º 38
Nas pesquisas envolvendo seres humanos deve ser assegurada a proteção dos direitos
fundamentais dos participantes da pesquisa, além da avaliação da necessidade,
utilidade e proporcionalidade do procedimento, com o máximo de benefícios e mínimo
de danos e riscos.
ENUNCIADO N.º 39
O estado de filiação não decorre apenas do vínculo genético, incluindo a reprodução
assistida com material genético de terceiro, derivando da manifestação inequívoca de
vontade da parte.
ENUNCIADO N.º 40
É admissível, no registro de nascimento de indivíduo gerado por reprodução assistida,
a inclusão do nome de duas pessoas do mesmo sexo, como pais.
ENUNCIADO N.º 41
O estabelecimento da idade máxima de 50 anos, para que mulheres possam submeterse
ao tratamento e à gestação por reprodução assistida, afronta o direito constitucional
à liberdade de planejamento familiar.
ENUNCIADO N.º 42
Quando comprovado o desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto,
resultando numa incongruência entre a identidade determinada pela anatomia de
nascimento e a identidade sentida, a cirurgia de transgenitalização é dispensável para
a retificação de nome no registro civil.
ENUNCIADO N.º 43
É possível a retificação do sexo jurídico sem a realização da cirurgia de
transgenitalização.
ENUNCIADO N.º 44
O absolutamente incapaz em risco de morte pode ser obrigado a submeter-se a
tratamento médico contra à vontade do seu representante.
ENUNCIADO N.º 45
Nas hipóteses de reprodução humana assistida, nos casos de gestação de substituição,
a determinação do vínculo de filiação deve contemplar os autores do projeto parental,
que promoveram o procedimento.

STJ nega reconhecimento de união estável em caso de traição e amante

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou, por unanimidade, no julgamento de um recurso especial, o reconhecimento de união estável pretendido por uma mulher por que o falecido mantinha outro relacionamento reconhecidamente estável com terceira pessoa. “Embora não seja expressamente referida na legislação pertinente como requisito para configuração da união estável, a fidelidade está ínsita ao próprio dever de respeito e lealdade entre os companheiros”, decidiu a turma do STJ, com base no voto da ministra-relatora Nancy Andrighi.

Uma mulher interpôs recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que já negara o pedido de reconhecimento, por entender que o relacionamento da autora da ação com o finado teria sido apenas um namoro, sem objetivo de constituição de família.

No recurso, a autora sustentou que manteve convivência pública, duradoura e contínua com o finado de julho de 2007 até o seu falecimento, em 30 de novembro de 2008, e que o “dever de fidelidade” não estaria incluído entre os requisitos necessários à configuração da união estável.

A outra companheira contestou a ação, alegando ilegitimidade ativa da autora, que seria apenas uma possível amante do falecido, com quem ela viveu, em união estável, desde o ano 2000 até o seu falecimento.

Respeito e lealdade

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, a controvérsia do recurso consistia em definir se a união estável pode ser reconhecida entre as partes, mesmo diante da inobservância do dever de fidelidade pelo falecido, que mantinha outro relacionamento estável com terceira, sendo que os dois relacionamentos simultâneos foram efetivamente demonstrados nos autos.

A ministra reconheceu que tanto a Lei 9.278/96 como o Código Civil não mencionam expressamente a observância do dever de fidelidade recíproca para que possa ser caracterizada a união estável, mas entendeu que a fidelidade é inerente ao dever de respeito e lealdade entre os companheiros.

“Conforme destaquei no voto proferido no REsp 1.157.273, a análise dos requisitos para configuração da união estável deve centrar-se na conjunção de fatores presente em cada hipótese, como a affectio societatis familiar, a participação de esforços, a posse do estado de casado, a continuidade da união, e também a fidelidade”, sublinhou Nancy Andrighi.

Para a ministra, uma sociedade que apresenta como elemento estrutural a monogamia não pode atenuar o dever de fidelidade – que integra o conceito de lealdade e respeito mútuo – para inserir no âmbito do direito de família relações afetivas paralelas.

A ministra concluiu o voto ressaltando que seu entendimento não significa dizer que a relação mantida entre a recorrente e o falecido mereça ficar sem qualquer amparo jurídico: “Ainda que ela não tenha logrado êxito em demonstrar, nos termos da legislação vigente, a existência da união estável, poderá pleitear em processo próprio o reconhecimento de uma eventual sociedade de fato.”

O voto da relatora foi reforçado por um comentário do ministro Sidnei Beneti. Para ele, divergir da relatora neste caso seria legalizar a “poligamia estável”.

 
 
do site Rede GNI

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Liminar restabelece pagamento de pensão a menor sob guarda


A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar no Mandado de Segurança (MS) 32907, impetrado por beneficiária de pensão contra ato do Tribunal de Contas da União (TCU) que determinou a suspensão do pagamento do benefício. A relatora suspendeu os efeitos do acórdão do TCU e restabeleceu a pensão.
A autora do MS é beneficiária de pensão temporária em razão do falecimento de servidora da Superintendência de Administração do Ministério da Fazenda de Alagoas. No entanto, o benefício foi cancelado pelo TCU sob a alegação de que a Lei 9.717/1998 teria revogado do regime de previdência social as categorias de pensão civil destinada, dentre outros, a menor sob guarda, prevista na alínea “b” do inciso II do artigo 217 da Lei 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União), que é a situação dos autos.
No MS 32907, a autora sustenta que o artigo 217 da Lei 8.112/1990 cuida de beneficiários, enquanto que o artigo 5º da Lei 9.717/1998 trata de benefícios, portanto, as duas normas teriam conteúdos diversos, e que não se confundiriam, até porque o benefício é o direito assegurado, enquanto que o beneficiário é o destinatário deste direito.
Decisão
A ministra Cármen Lúcia destacou que a Constituição da República garante à criança, ao adolescente e ao jovem direitos previdenciários, e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) dispõe que “a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários”.
A relatora citou precedentes em que o STF reconheceu ao menor sob a guarda de servidor na data da morte do instituidor, o direito à pensão temporária, sendo irrelevante ser a guarda provisória ou definitiva e entendeu-se também que a dependência econômica para recebimento da pensão temporária deve estar comprovada, ainda que o beneficiário estivesse sob a guarda do instituidor.
A ministra Cármen Lúcia assinalou que a decisão judicial assentando a dependência econômica da beneficiária em relação à instituidora da pensão atrai a proteção do parágrafo 3º do artigo 33 do ECA em relação à controversa revogação procedida pelo artigo 5º da Lei 9.717/1998. “Nessa linha, o indeferimento da liminar requerida nesta ação poderia acarretar a ineficácia se a medida viesse a ser deferida somente ao final, pela natureza alimentar das verbas recebidas pela impetrante”, afirmou.
A relatora frisou que o deferimento da liminar não constitui antecipação do julgamento do mérito da ação, não constitui direito nem consolida situação remuneratória. “Cumpre-se por ela apenas o resguardo de situação a ser solucionada no julgamento de mérito, a fim de que não se frustrem os objetivos da ação”, ressaltou.
RP/AD

Processos relacionados
MS 32907

site do STF

terça-feira, 13 de maio de 2014

Análise jurídica sobre decisão do STJ: “Collor terá de pagar pensão a ex-primeira-dama por três anos”

Quarta Turma admite fixação de alimentos compensatórios para ex-cônjuge
Presentes na doutrina, mas ainda pouco discutidos na jurisprudência brasileira, os alimentos compensatórios se destinam a restaurar o equilíbrio econômico-financeiro rompido com a dissolução do casamento. Na sessão desta terça-feira (12), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu a fixação de alimentos compensatórios ao julgar recurso do Fernando Collor.
No caso julgado, o ex-marido propôs duas ações – de oferecimento de alimentos e de separação judicial litigiosa. O juiz da 27ª Vara Cível da Comarca de Maceió reuniu as ações. O ex-marido ofereceu R$ 5,2 mil; a ex-mulher pediu R$ 40 mil.
Frustradas as tentativas de conciliação, o juiz proferiu sentença conjunta, arbitrando os alimentos em 30 salários mínimos mensais, a serem pagos enquanto a ex-mulher necessitar. Garantiu também à ex-mulher dois veículos (Corolla e Palio ou similares) e imóveis no valor total de R$ 950 mil.
Ao julgar a apelação, o Tribunal de Justiça de Alagoas, por maioria, reduziu a pensão mensal para 20 salários mínimos pelo período de três anos, mantendo a sentença no restante. No entanto, houve embargos infringentes, um tipo de recurso cabível quando a sentença é reformada por decisão não unânime. Nesse segundo julgamento, o tribunal estadual restabeleceu o valor de 30 salários mínimos e afastou a limitação de três anos.
Fora do pedido
No STJ, o ex-marido alegou que, na contestação, a ex-mulher fez referência tão somente aos alimentos no valor de R$ 40 mil, não mencionando nenhum valor a título compensatório. Para a defesa do ex-marido, isso representaria um julgamento extra petita, isto é, fora do pedido. Por isso, requereu a exclusão da obrigação quanto aos imóveis e aos veículos.
A defesa do ex-marido pediu, ainda, que o STJ fixasse um prazo certo para o pagamento dos alimentos, pois estes não poderiam configurar uma espécie de “aposentadoria”, estimulando o ócio. A ex-mulher tem 46 anos e possui formação superior.
Já a defesa da ex-mulher argumentou que ela se casou aos 19 anos e permaneceu ao lado do ex-marido por 22 anos, sem que qualquer bem tivesse sido colocado em seu nome, algo que demonstraria “abuso de confiança” por parte dele.
Livre convicção
Ao proferir seu voto, na sessão de 6 de novembro de 2012, o relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, entendeu não estar configurado julgamento extra petita. “A apreciação do pedido dentro dos limites propostos pelas partes na petição inicial ou na apelação não revela julgamento ultra ou extra petita”, afirmou.
O ministro explicou que o juiz fixa os alimentos segundo o seu convencimento, adotando os critérios da necessidade do alimentado e da possibilidade do alimentante. “Na ação de alimentos, a sentença não se subordina ao princípio da adstrição judicial à pretensão”, explicou.
O relator observou que a entrega dos apartamentos e dos veículos arbitrada pela sentença e a condenação ao pagamento de alimentos naturais (necessários) e alimentos civis (destinados à preservação da condição social da ex-mulher) levou em conta os elementos apresentados nos autos pelas partes.
Desequilíbrio 
Para o relator, no caso, houve ruptura do equilíbrio econômico-financeiro com a separação, sendo possível a correção desse eventual desequilíbrio com a fixação de alimentos compensatórios.
Quanto ao prazo para os alimentos, o ministro Antonio Carlos destacou que o pagamento vem sendo feito desde 2002. Assim, como a ex-mulher tem idade e formação que permitem sua inserção no mercado de trabalho, o ministro votou, inicialmente, pelo pagamento de prestação alimentícia por três anos, a contar do trânsito em julgado da decisão.
Na sessão desta terça-feira, após os votos-vista da ministra Isabel Gallotti, proferido em 19 de setembro, e do ministro Marco Buzzi, a Turma, por maioria de votos, deu parcial provimento ao recurso, acompanhando o voto do relator.
O ministro Luis Felipe Salomão ressaltou que a conclusão do relator corresponde à jurisprudência do STJ. Há precedentes da Corte que fixam a tese de que o pedido de pensão formulado é meramente estimativo. Não configura decisão extra petita o arbitramento de valor maior que o solicitado, com base nos elementos do processo.
Nesse ponto, o ministro Marco Buzzi ficou vencido. Reconheceu o julgamento fora do pedido apresentado pelas partes e considerou que a cessão de bens viola o regime de casamento estabelecido em acordo pré-nupcial.
Prazo da pensão
No mesmo recurso, o ex-marido contestou o valor da pensão estabelecido em 30 salários mínimos, e sua duração por tempo indeterminado – enquanto a mulher necessitasse e o alimentante pudesse pagar, ou até a ocorrência de algum fato novo que permitisse a revisão dos alimentos. Na ação, o ex-marido ofertou pensão alimentícia de R$ 5,2 mil e a ex-mulher pediu R$ 40 mil.
Por unanimidade de votos, a Turma manteve a pensão em 30 salários mínimos. Contudo, após intenso debate, a maioria dos ministros fixou o prazo de três anos para pagamento da pensão, a contar da publicação do acórdão desse julgamento.
O ministro Antonio Carlos Ferreira aderiu, no ponto, aos votos dos ministros Luis Felipe Salomão e Raul Araújo, que consideraram o prazo de três anos, a contar dessa decisão, suficiente para a mulher se organizar e ingressar no mercado de trabalho.
A ministra Isabel Gallotti e o ministro Marco Buzzi ficaram vencidos. Votaram pela manutenção do prazo indeterminado. Segundo eles, é muito difícil para uma mulher de aproximadamente 50 anos de idade, sem nenhuma experiência profissional, inserir-se no mercado de trabalho. Apesar de ter concluído o ensino superior, a mulher nunca trabalhou. Casou-se aos 19 anos e sempre acompanhou o marido em sua carreira política.
Entendimento jurídico a luz da legislação e jurisprudência
Há reiterada jurisprudência no tocante aos alimentos transitórios compensatórios, bem como a comunicação de bens na partilha mesmo sendo o regime de casamento de separação total de bens.
Como lecionam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, no atual Direito de Família brasileiro, a obrigação alimentar é recíproca entre os cônjuges e constitui expressão dos deveres de solidariedade e mútua assistência na esfera familiar, subsistentes ainda que extinto o vínculo jurídico e afetivo, e do próprio direito social à alimentação, previsto na Lei Maior.
Nessa perspectiva, são devidos alimentos, abrangendo todos os meios materiais necessários ao bem-estar físico e psíquico da pessoa, ao cônjuge que se encontrar privado de recursos para o próprio sustento.
Sobre os alimentos decorrentes da dissolução da sociedade conjugal e da união estável, dispõe o Código Civil de 2002, em seu artigo 1.694:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1.º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
§ 2.º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
Resulta da leitura do dispositivo supratranscrito que é lícito ao cônjuge pedir alimentos compatíveis com seu padrão de vida atual, os quais haverão de ser estipulados dentro de parâmetros aceitáveis de razoabilidade e proporcionalidade, em consideração às necessidades do alimentando e às possibilidades do alimentante.
Sabe-se que, em sede jurisprudencial e doutrinária, desenvolveu-se a noção de “alimentos compensatórios”, que remete à fixação de pensões alimentícias no intento de equilibrar os efeitos do divórcio, quando apenas um dos cônjuges tem seu status social e econômico severamente afetado pelo fim da união conjugal.
Preleciona a respeito o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves:
A doutrina e a jurisprudência têm-se reportado a outra espécie de alimentos, os “compensatórios”, adotados em países como a França e a Espanha e, mais recentemente, o Brasil. Visam eles evitar o descomunal desequilíbrio econômico-financeiro do consorte dependente, impossível de ser afastado com modestas pensões mensais e que ocorre geralmente nos casos em que um dos parceiros não agrega nenhum bem em sua meação, seja porque não houve nenhuma aquisição patrimonial na constância da união ou porque o regime de bens livremente convencionado afasta a comunhão de bens.
Assevera Rolf Madaleno que “o propósito da pensão compensatória é de indenizar por algum tempo ou não o desequilíbrio econômico causado pela repentina redução do padrão socioeconômico do cônjuge desprovido de bens e meação, sem pretender a igualdade econômica do casal que desfez sua relação, mas que procura reduzir os efeitos deletérios surgidos da súbita indigência social, causada pela ausência de recursos pessoais, quando todos os ingressos eram mantidos pelo parceiro, mas que deixaram de aportar com a separação ou com o divórcio. Entre os franceses a pensão compensatória pode ser creditada em um valor único, com a entrega em moeda ou bens, e também pelo usufruto de uma determinada propriedade ou mediante a cessão de créditos”. (GONÇALVES, CARLOS ROBERTO. Direito Civil Brasileiro. Direito de Família, vol. 6. São Paulo: Saraiva, 2012)
Assim, é de se reconhecer a possibilidade de estipulação de alimentos em valor suficiente à manutenção do perfil econômico-financeiro da credora e não somente para garantir o custeio dos gastos básicos de existência.
Vários precedentes desta Egrégia Corte já acataram a cobrança de alimentos compensatórios:
CIVIL – DIVÓRCIO LITIGIOSO – ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS, A SEREM PRESTADOS DURANTE 12 (DOZE MESES). MULHER QUE SE ENCONTRA DESEMPREGADA, EM VIRTUDE DE HAVER-SE DEDICADO ÀS TAREFAS DOMÉSTICAS, NA ÉPOCA EM QUE FOI CASADA COM O APELANTE. BINÔMIO NECESSIDADE X POSSILIBIDADE. SENTENÇA MANTIDA. APELO IMPROVIDO
1. “Produzindo o fim do casamento desequilíbrio econômico entre o casal, em comparação com o padrão de vida de que desfrutava a família, cabível a fixação de alimentos compensatórios. Em decorrência do dever de mútua assistência (CC 1.566 III), os cônjuges adquirem a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família (CC 1.565). Surge, assim, verdadeiro vinculo de solidariedade (CC 265), devendo o cônjuge mais afortunado garantir ao ex-consorte alimentos compensatórios, visando a ajustar o desequilíbrio econômico e a reequilibrar suas condições sociais. Faz jus a tal verba o cônjuge que não perceber bens, quer por tal ser acordado entre as partes, quer em face do regime de bens adotado no casamento, que não permite comunicação dos aquestos” (in Divórcio Já, Maria Berenice Dias, RT, 2012, pág. 122).
2. A estipulação de pensão alimentícia pelo lapso temporal de 12 (doze) meses, se mostra razoável, uma vez que a requerida é uma pessoa saudável, com apenas 29 anos de idade, que tem condição de se inserir no mercado de trabalho e conseguir uma vaga de emprego com remuneração suficiente para sua subsistência.
3. Considerando as condições das partes, não se mostra excessiva a fixação de pensão alimentícia no percentual de 10% dos rendimentos brutos. Ainda que o apelante afirme que haverá comprometimento de suas despesas pessoais, podendo até prejudicar a sua vida pessoal e financeira, não há nos autos nada que indique esta situação.
4. Recurso improvido. (Acórdão n.636744, 20110710144307APC, Relator: JOÃO EGMONT, Revisor: LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 21/11/2012, Publicado no DJE: 27/11/2012. Pág.: 240)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 4º DA LEI 5.478/66 C/C ART. 7º DA LEI 9.9278/96. VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES. LESÃO GRAVE E DIFÍCIL REPARAÇÃO.
1. Se os documentos juntados com a petição inicial parecem, efetivamente, indicar que as partes conviveram em regime de união estável e que pode haver efetivo desequilíbrio na partilha do patrimônio, isso é suficiente para dar suporte ao pedido de fixação de alimentos que a doutrina vem chamando de ‘compensatórios’, que visam à correção do desequilíbrio existente no momento da separação, quando o juiz compara o status econômico de ambos os cônjuges e o empobrecimento de um deles em razão da dissolução da sociedade conjugal. A própria tese acerca da possibilidade de fixação de alimentos compensatórios – bem como a da prevalência do princípio da dignidade da pessoa humana sobre o da irrepetibilidade dos alimentos – insere-se no contexto da verossimilhança, emprestando relevância aos fundamentos jurídicos expendidos na peça de recurso.
2. A alegação de ocorrência de desequilíbrio na equação econômico-financeira sugere, de forma enfática, a potencialidade de causação de lesão grave e de difícil reparação, a demandar atuação jurisdicional positiva e imediata por meio do recurso de agravo.
3. Demonstrada a verossimilhança dos fatos alegados na petição do agravo, bem como o fundado receito de dano irreparável ou de difícil reparação, deve ser mantida a liminar deferida.
4. Recurso provido. (Acórdão n.508103, 20110020035193AGI, Relator: ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS, 4ª Turma Cível, Data de Julgamento: 25/05/2011, Publicado no DJE: 02/06/2011. Pág.: 148)
A obrigação de prestar alimentos transitórios – a tempo certo – é cabível, em regra, quando o alimentando é pessoa com idade, condições e formação profissional compatíveis com uma provável inserção no mercado de trabalho, necessitando dos alimentos apenas até que atinja sua autonomia financeira, momento em que se emancipará da tutela do alimentante – outrora provedor do lar -, que será então liberado da obrigação, a qual se extinguirá automaticamente.
Nesse particular, portanto, concedo à autora, pelo prazo de 30 meses a contar da publicação do acórdão, a pensão alimentícia acima especificada, tempo que creio ser suficiente para sua recolocação profissional e obtenção de autonomia financeira.
Fundado nessas considerações, dou parcial provimento ao apelo para majorar os alimentos do menor para quantia equivalente a 15 salários mínimos mensais e fixar alimentos de 3 salários mínimos para a virago pelo prazo de 24 meses após a publicação do acórdão.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.09.518507-0/004, Relator: Des. ALBERTO VILAS BOAS, 1ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 12/03/2013, Data de Publicação no DJE: 21/03/2013)
Não obstante a dedicação certamente destinada às filhas e ao lar, e a obrigação do ex-convivente, fulcrada na solidariedade familiar, de não deixar ao desamparo aquela que consigo compartilhou a vida, certo é que o numerário estipulado mostra-se plenamente satisfatório ao atendimento das necessidades da ex-mulher, até que consiga se manter.
Do mesmo modo, o prazo de 02 (dois anos) definido para o recebimento de alimentos provisórios, apresenta-se proporcional e condizente com o tempo que levará a jovem mulher para se reerguer no mercado de trabalho.
(Acórdão AG 20120263630 SC 2012.026363-0, Relator: Des. RONEI DANIELLI, Sexta Câmara Cível, Data de Julgamento: 19/09/2012)
Advogada: Marielle dos Santos Brito OAB.DF 26.049, Membro da Comissão da OAB/DF
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